Autor: Edvaldo
Pitanga *
Constato com alegria, e
um pouco de pesar também, que daqui a trinta dias completarei 59 anos de vida.
Destes, 35 anos de militância, inicialmente no Partido dos Trabalhadores – ao
qual permaneço filiado – e, depois, no sindicalismo do setor público federal e
na CUT, onde continuo em atividade.
É inevitável a volta ao
passado, rememorando inúmeros fatos e passagens desta trajetória política,
alguns de boa lembrança, outros não tanto assim. Então resolvi me ater às boas
recordações. Porque segundo o pessoal entendido em astrologia esse período de
trinta dias que antecede o aniversário é considerado nosso “inferno astral”, se
bem que não sei exatamente o que significa isso. Parece-me ser um momento
conturbado que termina no dia em que você aniversaria. Então vou contrapor com
pensamentos positivos.
Sem muito esforço, no
meio do turbilhão de lembranças, o ‘eu’ e o ‘nós’ tomaram forma. Explico.
A nossa iniciação
política foi feita à luz dos ensinamentos do Marx e do Lenin, onde o
individualismo – o ‘eu’ – era intensamente combatido e execrado porque se
chocava com o interesse coletivo – o ‘nós’. E essa compreensão perpassava toda
a nossa conduta e o nosso discurso. Era
assim, mesmo que a tarefa fosse realizada somente por um(a) militante,
na hora da prestação de contas ele/ela dizia: “nós fizemos” ou “nós deixamos de
fazer”. Isso consolidava a nossa convicção de que não nos construímos sozinhos,
que não conquistamos nada que não fosse fruto do esforço de um grupo – o ‘nós’
– portanto, não cabia a referência no singular – o ‘eu’. Continuo acreditando
nisso.
Mas, inversamente ao
que aconteceu há trinta e tantos anos, hoje o ‘nós’ cedeu lugar ao ‘eu’.
Continuo explicando. Aliás, explicando esse texto e tentando entender o porquê
dessa mudança ideológica.
Construímos e
conquistamos importantes espaços de poder – inclusive a presidência da
república – e à medida que essas estruturas são ocupadas por ‘nosso pessoal’, a
principio para tocar o projeto de acordo com nosso programa, a coisa muda de
figura. Talvez embevecidos com o exercício do poder, por menor que seja –
aliás, quanto menor o nível hierárquico ocupado na burocracia, maiores são as
demonstrações de arrogância, rispidez e petulância – acabam cooptados (as) e
absorvidos (as) pela ideologia burguesa e se afastando da missão e dos
objetivos para os quais o conjunto da classe trabalhadora – o ‘nós’ – lutou e
depositou confiança para a realizarem a mudança. Dessa forma, o ‘eu’ se
agiganta. Isso, quanto ao Estado – nacional e subnacionais.
No meu universo sindical o ‘nós’ pouco está
aparecendo nos discursos. O que aconteceu? Não fomos cooptados pelo aparelho
autoritário e opressivo do Estado; continuamos a representar os interesses da
categoria a que pertencemos e que nos elegeu. Continuamos a discutir e deliberar
nas instâncias próprias: congressos, assembleias, diretorias, etc. Por que,
então, o ‘eu’ é repetido inúmeras vezes? Necessidade de autoafirmação do (a)
dirigente? Afloramento do projeto pessoal – ‘eu’ – em contraposição ao coletivo
– ‘nós’? Necessidade de retomarmos a educação sindical classista em nosso meio?
Inúmeras perguntas.
Só sei dizer que,
embora tenha escrito este texto no singular – ‘eu’ – morro de saudade do ‘nós’.
*
Edvaldo Pitanga é sindicalista
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