Edvaldo Pitanga(*)
"Se com o nosso enforcamento vocês pensam em destruir o movimento
operário - este movimento de milhões de seres humilhados, que sofrem na pobreza
e na miséria, esperam a redenção – se esta é sua opinião, enforquem-nos. Aqui
terão apagado uma faísca, mas lá e acolá, atrás e na frente de vocês, em todas
as partes, as chamas crescerão. É um fogo subterrâneo e vocês não poderão
apagá-lo!"
August
Spies
"Arrebenta a tua necessidade e o teu medo de ser escravo, o pão é a
liberdade, a liberdade é o pão".
Albert Parsons
Essas foram as palavras de dois
lideres e mártires de Chicago ao receberem a pena de morte por enforcamento.
Outros dois também foram enforcados e um cometeu suicídio na prisão. O processo
se desenrolou rapidamente, a justiça burguesa inventou testemunhas e provas
para condená-los. Qualquer semelhança com os dias atuais não é mera
coincidência. As comemorações do 1º de Maio – Dia Internacional do Trabalhador –
têm aí sua origem, é um dia de luta e de luto.
Hoje, no Brasil, dificilmente algum
trabalhador será enforcado por lutar pelos seus direitos. Mas os patrões
encontraram outras formas de enforcá-los sem usar o patíbulo. Eles se
aproveitam, principalmente, da incapacidade do Estado de fiscalizar e fazer
cumprir as leis trabalhistas e precarizaram o trabalho a níveis insuportáveis.
O assédio moral e as péssimas condições de trabalho são as partes mais visíveis
deste cenário.
Em maio de 2006, o Brasil lançou a
Agenda Nacional de Trabalho Decente, assinada pelo Presidente Lula. O país é
pioneiro no estabelecimento de agendas subnacionais sobre o tema. A Bahia
lançou sua agenda em dezembro de 2007 e o Mato Grosso em abril de 2009. Sem
dúvida uma iniciativa louvável por parte do Estado brasileiro.
“O Trabalho Decente é o ponto de
convergência dos quatro objetivos estratégicos da Organização Internacional do Trabalho
- OIT: o respeito aos direitos no trabalho (em especial aqueles definidos como
fundamentais pela Declaração Relativa aos Direitos e Princípios Fundamentais no
Trabalho e seu seguimento adotada em 1998): (i) liberdade sindical e
reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva; (ii) eliminação de
todas as formas de trabalho forçado; (iii) abolição efetiva do trabalho
infantil; (iv) eliminação de todas as formas de discriminação em matéria de
emprego e ocupação), a promoção do emprego produtivo e de qualidade, a extensão
da proteção social e o fortalecimento do diálogo social.” (1)
Mas, contraditoriamente neste
período vemos crescer assustadoramente os processos por assédio moral na
Justiça do Trabalho. Na Bahia, em 2001, somente um caso foi registrado. Já em
2010, foram 981. As grandes empresas, bancos e fábricas implantaram esse
ambiente hostil, que nada fica a dever às relações de trabalho do século dezenove
só que de maneira mais sutil e sofisticada. É a luta de classes dos tempos
atuais.
Em outubro de 2013, o Walmart – o
Bompreço aqui na Bahia – foi condenado a pagar 22,3 milhões de indenização por
danos morais coletivos (está recorrendo da sentença); a Samsung em Manaus
responde a um processo do Ministério Público do Trabalho no valor de 250
milhões de reais por razões semelhantes (está buscando acordo); o HSBC, em
fevereiro desse ano, foi multado em 67,5 milhões de reais em Curitiba por espionagem
dos seus funcionários, é a arapongagem no mundo do trabalho (condenação em
primeira instância). Some-se a isso o fato de que o Brasil é o quarto país em
acidentes de trabalho. Fiquemos por aqui com estes (maus) exemplos.
É difícil de entender um país que
assume o trabalho decente como meta seja o mesmo que não promova os meios para
que ele aconteça. O Ministério do Trabalho principal instrumento do Estado para
garantir a segurança e os direitos dos trabalhadores, não possui a mínima
condição de cumprir, com dignidade, seu papel institucional.
O governo brasileiro não está
cumprindo a Convenção 81 da OIT, já ratificada, especialmente no seu artigo 10,
que estabelece aos países signatários um quantitativo mínimo de
Auditores-Fiscais do Trabalho em relação ao número de estabelecimentos
comerciais. A partir desta convenção, observamos que o número ideal hoje seria
de 5.800 auditores, porém temos apenas 2.741 em todo o Brasil.
Aliado a esses dados vergonhosos,
temos uma carência de servidores técnicos administrativos na área meio, o que
dificulta sobremaneira o necessário apoio a atividade de fiscalização. Somente
no último concurso da área meio do Ministério, de cada dez servidores nomeados,
oito pediram exoneração devido aos baixos salários bem como as péssimas
condições de trabalho existentes.
Na Bahia, o Estado subnacional
pioneiro na implantação da Agenda do Trabalho Decente, não vemos no âmbito da
gestão pública estadual – onde ele tem maior governabilidade de implantação – mudanças
dignas de registro na relação de trabalho com seus servidores.
Aliás, em território nacional os
avanços nesse sentido encontram-se estagnados, vide a regulamentação da
Convenção 151 da OIT – negociação coletiva no setor público – que se encontra
paralisada sem perspectiva de solução em médio prazo. Quem sabe em longo prazo?
Do outro lado da moeda está o
movimento sindical com conquistas significativas nesse período, mas manietado
por uma legislação retrógrada que impede no local de trabalho a organização das
pessoas, espaço principal do conflito capital x trabalho.
Sem sombra de dúvida também
comemoramos a criação de 22 milhões de empregos com carteira assinada no Brasil
e os 570 mil na Bahia, mas precisamos ficar atentos aos processos de trabalho
para que eles sejam realmente decentes.
A tarefa dos sindicatos combativos é banir o lado indecente do mundo do trabalho e manter
acesa a chama do fogo subterrâneo que a burguesia não poderá apagar.
(1) Extraído do site da OIT Brasil
(*) Edvaldo Pitanga é sindicalista
Nenhum comentário:
Postar um comentário